Semanas depois do hiper comentado acontecido com a estudante Geise Arruda na Unibam,restam talvez,ainda ,algumas perguntas e algumas respostas que podemos tentar destrinchar.No país da nudez celebrada no carnaval,do fio dental,da sexualidade presente no dia a dia,parece ser um contra-senso,o episódio da Unibam.Aparentemente sim,mas existem contradições que jazem lá no fundo de um certo 'inconsciente coletivo' brasileiro.Nosso país foi colonizado por um dos países mais conservadores e também mais pobres da Europa,a maneira como a sociedade brasileira se organizou desde o começo,foi um modo baseado na força,na coerção social e moral.A nostalgia que muitos de nós,às vezes temos de um passado rural um tanto idílico,nos faz esquecer o quanto de horror,de violência,de autoritarismo profundo esse tempo esconde.Basta-nos ler algumas páginas de Guimarães Rosa,de Bernardo Élis,de Mário Palmério,para mergulharmos nessa época de massacres,de intolerâncias consentidas,em que a carolice mais nojenta,a hipocrisia mais tentacular,a violência mais absurda eram o pão de cada dia.A sociedade brasileira ainda sofre,dia a dia,hora a hora ,das cicatrizes da escravidão,da violência(que ainda não nos abandonou),da opressão das minorias,desse fardo pesado do' país da bunda'.O caso Geise nos mostra muito claramente como o machismo mais primário ainda é um componente forte do inconsciente coletivo do brasileiro,porque para muitos uma jovem mulher de mini-vestido é uma ameaça elocubrada em suas mentes deturpadas.Só se esquecem que essa jovem mulher,assim como todas as outras mulheres são donas de seus corpos,de exibi-los não como 'provocações',mas como parte da natureza que os fez como tais.
A classe média brasileira(da qual faço parte),é a primeira,em grande parte,a se proclamar adepta da modernidade,a favor das minorias historicamente oprimidas,da política como instrumento de mudança histórica.Mas é também a primeira a (com exceções,claro),a nunca levar para a vida real esse paradigma radical da mudança como motor do progresso humano.O caso Geise,em que a moça foi chamada de brega,burra,'aparecida',mostra como se confunde o que pode ser um futuro de respeito à pessoa humana,com um 'politicamente correto'repudiado a todo custo,sem nenhuma análise crítica.O que hoje se chama um tanto pejorativamente de 'politicamente correto' foi (e é)uma maneira de dar voz aos que nunca tiveram ou a tiveram deturpada e silenciada ao longo da história.Se não existisse um mínimo dessa correção política o que seria de tantos segmentos sociais politica e literalmente massacrados?É muito fácil criticar fatos de um pretenso pedestal, desqualificar pessoas e movimentos,desprezar qualquer tipo de correção de erros históricos.A história,acredito modestamente,não se repete como farsa,mas sim,caminha.
É preciso abrir os olhos para uma modernidade que sim,inclua absolutamente todos,que seja totalmente democrática,sem opressões sociais e principalmente,psicológicas.Que Geise,vestida ou nua,se expresse como bem lhe aprouver.E viva a liberdade,a solidariedade com o outro,o por-se no lugar do outro.