Que pode uma criatura senão,
entre criaturas,amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar,desamar,amar?
sempre,e até de olhos vidrados,amar?
Que pode,pergunto,o ser amoroso,
sozinho,em rotação universal,senão
rodar também,e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ela sepulta,e o que,na brisa marinha,
é sal,ou precisão de amor,ou simples ânsia
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito,o cru,
um vaso sem flor,um chão de ferro,
e o peito inerte,e a rua vista em sonho,e uma ave de
rapina.
Este é o nosso destino:amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente,de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor,e na secura nossa
amar a água implícita,e o beijo tácito,e a sede infininita.
Um dos mais belos poemas do século XX na minha humilde opinião.Drummond é inquestionavelmente um orgulho para o nosso país,uma glória.