Para ver-Cena final de "Rainha Cristina"(1933) de Rouben Mamoulian


Essa é a cena final de "Queen Christina"(Rainha Cristina),de Rouben Mamoulian(1933).Uma das mais belas e citadas cenas finais de filmes,objeto até de teses em cursos de cinema.Cristina,a revolucionária rainha da Suécia(1626-1689),perde o amante Don Antonio em um duelo.Amargurada,ela abdica ao trono e deixa a Suécia.Sozinha na proa do navio,Cristina vive toda sua tristeza e desespero.Cena emblemática,de uma época em que o cinema era mesmo a sétima arte,mostra todo o poder do rosto hipnótico de Garbo.À medida que a câmera se aproxima de seu rosto,ela parece fitar o nada,totalmente projetada para dentro de si mesma.
Garbo diz em suas memórias que pediu instruções a Mamoulian sobre qual expressão facial ele sugeriria.Mamoulian disse a ela:-Não pense em nada,fique fazia.Vislumbre um vazio dentro de você.O resultado é este:beleza em estado puro,que,infelizmente,poucas vezes nos é dado ver em nossa triste época.

Enquanto isso no Brasil...


Imagens daqui e daqui

Para ver-"Blade Runner" de Ridley Scott(1982)

"O futuro não é mais o que era antigamente",diz o grande Renato Russo em uma de suas canções.E isso parece se tornar mais e mais verdadeiro à medida que avançamos no tempo e na história.Os últimos 200 anos só confirmaram nosso imenso talento para causar sofrimentos sem conta à nossa própria espécie e às outras(muitos de nós ainda se acham superiores aos animais-vã ilusão),enquanto uma parte da humanidade conseguia progressos nunca antes vistos em saúde,educação,democracia e direitos iguais.Essa dicotomia reinante em nosso planeta,ainda tão distante de uma sociedade onde todos tenham sua justa parte gerou,é claro,rios de tinta e quilômetros de película cinematográfica.E mais ainda,a idéia de um futuro utópico (ou distópico),dá o tom da ficção científica dos últimos 100 anos.Como não deixaria de ser,os extremos se fazem presente:ora um futuro de felicidade completa e harmônica,ora um terrível e sombrio tempo,dominado por máquinas,robôs ou super computadores que escravizam o ser humano.Há obras porém,que propõe uma leitura mais nuançada de futuros possíveis.Uma delas é o magnífico "Blade Runner"(1982) do diretor inglês Ridley Scott.
Baseado na novela do escritor americano Philip K.Dick(1928-1982)-"Do Androids Dream Of Electric Sheep?"(algo como "Androides sonham com carneiros elétricos?"-literalmente),Blade Runner é uma "Estravaganza" visual,mostrando uma Los Angeles hiper-caótica em 2019,com inimagináveis níveis de poluição(parace ser sempre noite),um governo ao mesmo tempo invisível e onipresente.A biopolítica havia criado os robôs perfeitos,chamados replicantes para o trabalho duro nas colônias fora da terra e inclusive para propósitos de diversão sexual.Mas como sempre acontece na realidade e na ficção,os fatos fogem ao nosso pobre controle.
O enredo gira em torno da fuga de 4 replicantes e sua entrada clandestina na Terra.Como depois de uma revolta eles são proibidos de pisar no planeta sobre pena de morte,um antigo caçador de replicantes-Deckard(Harrison Ford),assume sua localização e perseguição.Deckard,totalmente baseado nos detetives dos filmes"noir" dos anos 40 é o típico sujeito durão,que não leva desaforo para casa.Em visita à poderosa Tyrrel Corporation(que cria os replicantes),Deckard conhece a bela e super misteriosa Rachel(Sean Young-simplesmente maravilhosa),o que levará a uma poderosa história de amor.Deckard encintra os replicantes e é claro,tem que executar sua tarefa macabra.Mas tudo isso parece abrir seus olhos para o fato que a realidade é muito mais complexa que imaginamos;especialmente ao confrontar Roy(Rutger Huer),o chefe dos replicantes(em cena antológica do cinema,em meio à chuva),isso sem mencionar o final.
Lembro de ter visto "Blade Runner"no antigo Cine Pathé em Belo Horizonte nos anos 80,e ter saido embasbacado.Ali estava um filme de ficção científica complexo e porque não humanista,uma obra que ia fundo(em uma época em que não se falava disso)na crítica à destruição dos recursos do planeta,à dominação do biopoder sobre nossas vidas,e à banalização dos sentimentos e à coisificação do ser humano como mero consumidor e mercadoria.Um filme barroco,de cores e clima sombrio-nisso,bem distante do 'corderosismo' de tantas produções hollywoodianas.Se nosso futuro como espécie será aterrador ou não,tenho a total convicção que cabe a nós e nossos descendentes decidir-ao combater os verdadeiros inimigos-aqueles que sorrateiramente fazem da condição humana um simples episódio biológico,sujeito unicamente à exploração e à dominação.Uma grande obra para ver e rever sempre.
Obs-Conheço duas versões de Blade Runner-a do estúdio e a do diretor.










Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas,amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar,desamar,amar?
sempre,e até de olhos vidrados,amar?

Que pode,pergunto,o ser amoroso,
sozinho,em rotação universal,senão
rodar também,e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta,e o que,na brisa marinha,
é sal,ou precisão de amor,ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito,o cru,
um vaso sem flor,um chão de ferro,
e o peito inerte,e a rua vista em sonho,e uma ave de
                                                                      rapina.

Este o nosso destino:amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente,de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,e na secura nossa
amar a água implícita,e o beijo tácito,e a sede infinita.

(Carlos Drummond de Andrade)

Right Now-Van Halen







Don't wanna wait 'til tomorrow
Why put it off another day?
One by one, little problems
Build up, and stand in our way. Oh

One step ahead, one step behind it
Now ya gotta run to get even
Make future plans I'll dream about yesterday, hey!
Come on turn, turn this thing around

(Right now) Hey! It's your tomorrow
(Right now) Come on, it's everything
(Right now) Catch your magic moment
Do it right here and now
It means everything

Miss a beat, you lose a rhythm
An nothin' falls into place. No!
Only missed by a fraction
Slipped a little off your pace. Oh!

The more things you get, the more you want
Just trade in one for another
Workin' so hard to make it easy
Whoa, got to turn. Come on, turn this thing around

(Right now) Hey, it's your tomorrow
(Right now) Come on, it's everything
(Right now) catch that magic moment
Do it right here and now
It means everything

Said a lie to me
Right now
What are ya waitin' for? Oh! Yeah!
Right now

(Guitar Solo)

(Right now) Hey! It's your tomorrow
(Right now) Come on, it's everything
(Right now) Catch that magic moment
And do it right, right now (Right now)
Oh, right now!

It's what's happening
Right here and now
Right now, it's right now
Oh!
Tell me, what are ya waitin' for?
Turn this thing around

Um clássico absoluto,que resiste aos anos.Original e mais que nunca atualíssimo em nossa triste época do mercado total e da coisificação do ser humano,"Right Now' se destaca hoje pela bela letra,pelos arranjos e pela mensagem,dando sua visão do mundo contemporâneo e do que nos resta-lutar e ter esperança sempre.

Para ler-"A Obra em Negro" de Marguerite Yourcenar(1968)


Todos nós temos a visão de um certo paraíso perdido ideal:a infância ou a adolescência,um dia qualquer de felicidade intensa,perdido no tempo;um relacionamento,um lugar,ou até mesmo um livro,uma obra de arte.A história da humanidade nomeia certos períodos como "idades de ouro",tempos de mudanças de paradigma,épocas ideais em que supostamente um certo senso comum teria sido sobrepujado,e assim,teríamos atingido um novo patamar ou recuperado idéias e construções mentais há muito perdidas.



O século XVI é certamente uma época conhecida pelo retorno à antiguidade greco-latina,que há muito mofava nas bibliotecas dos mosteiros da Europa ou jazia dilapidada nos templos e edifícios públicos remanescentes,sendo conhecida por uma ínfima minoria de estudiosos.Era impressionante que no século XIV,o grego que durante centenas de anos fora a língua franca do Império Romano,fosse conhecido talvez por algumas centenas de pessoas.O que causou a mudança radical foi a intensificação do comércio,especialmente no norte da Itália e na região da Flandres(hoje Bélgica e Holanda),o que gerou uma prosperidade e um bem estar que haviam desaparecido do ocidente há mil anos.
A partir da metade do século XV,nas pequenas cidade-estado italianas(Florença,Milão,Nápoles,Ferrara,Mântua,Veneza,Pádua,Gênova,Turim),começou o movimento hoje conhecido como "Renascimento"(Rinàscita).A quantidade de gênios da pintura,da escultura,da arquitetura,do desenho,da gravura,da engenharia,da tradução(entre tantas outras áreas),parece ser mesmo sem precedentes na história da humanidade:Desde aqueles considerados os primeiros humanistas -Francesco Petrarca e Giovanni Bocaccio até Fra Angelico,Cimabue,Giotto,Pinturicchio,Della Robbia,Aretino,Andrea del Sarto,Masaccio,Boticelli,chegando aos grandes Leonardo da Vinci,Michelangelo,Rafael e Tintoretto,a renascença deu ao mundo uma nova e real perspectiva.
Porém,em uma contradição que parece ser peculiar à nossa espécie,as magníficas conquistas do renascimento ocorreram paralelas a um dos séculos mais sangrentos a registrar,em que mudanças radicais balançaram o equilíbrio de uma sociedade autoritária e hiper-hierarquizada.O surgimento do protestantismo causou a ruptura da unidade da cristandade européia.levando não só a antagonismos na esfera religiosa,mas também na política e social.As guerras de religião,a repressão dos movimentos sociais,as perseguições da inquisição aos dissidentes-contestadores do catolicismo oficial,ensanguentaram a Europa nesse século de contrastes gritantes.Por volta de 1550,a expectativa de vida média era de 32 anos,definida principalmente pela guerra constante,a altíssima mortalidade infantil e as pandemias frequentes(devido á precariedade da higiene e da habitação),para as quais não existia nem profilaxia nem medicamentos.
É usando esse pano de fundo que a grande escritora francesa Marguerite Yourcenar(1903-1987) escreveu "A Obra em Negro"(1968).Seu herói é um anti-herói,Zênon Ligre,aquele que discorda,que estuda o que pode compulsivamente,e principalmente, o que contesta as supostas "verdades"sociais.Nascendo bastardo(filho de uma adolescente e de um padre italiano)em uma rica família de banqueiros da cidade flamenga de Bruges,desde muito cedo conhece o desprezo e os entrelaçamentos falsos e pegajosos da moral burguesa,que vive "eternamente dentro de sua própria peça teatral".Destinado(como então os bastardos das famílias ricas)ao sacerdócio,decide procurar seu próprio caminho e tentar apreender algum sentido naquele mundo mesquinho e mergulhado nas mais grosseiras superstições.Estuda a precária medicina da época ,assim como a filosofia,e descobre que se quiser sobreviver às fogueiras da inquisição deve se esconder,tornar-se como que um outro.Esse romance essencial está repleto de sangue e vida,e é uma ode ao espírito humano que tenta se situar em meio ao caos político e social,que tenta erguer a cabeça entre os escombros de um mundo em constante transformação.Zênon passa pela vida como mais um,aos olhos da multidão desatenta,mas acumula para si a vivência profunda da vida como fim em si,não meramente como simples existência biológica,como um simplesmente "estar aqui"sem tentar levantar nem uma mínima fímbria da cortina que nos cerca.
Lançado no ano emblemático de 1968,"A Obra em Negro"foi saudado como uma obra prima pela crítica francesa,e Marguerite Yourcenar recebeu(pela segunda vez)um dos mais importantes prêmios literários franceses,o Femina.Ao nos desenrolar um outro século XVI,longe das belezas da renascença,e mais próximo ao sofrimento real de um ser humano deslocado em uma época dura da humanidade,a escritora faz também uma analogia com nosso tempo,aparentemente"ordenado",mas devorado pelas bordas pelo desrespeito ao outro,a destruição da natureza(em escala jamais vista),o mais absurdo consumismo e pela cada vez mais onipresente presença de um bio-poder difuso e que se fortalece.Infelizmente tudo muito parecido com o século XVI onde Zênon padece da angústia de quase nada poder fazer,enquanto se debate em meio à piedade por seus semelhantes.Uma obra que consumiu vinte anos de escrita e que ao final,nos dá mais um alento,mais uma esperança que a vida cale a pena se for objeto de transformação externa e interna.

Invenção-Haroldo de Campos(1929-2003)

          se
                                           nasce
                                           morre   nasce
                                           morre   nasce    morre
                                                                               renasce   remorre   renasce
                                                                                                remorre   renasce
                                                                                                                  remorre
                                                                                                                              re
                                                                   re
                                                      desnasce
                                  desmorre   desnasce
              desmorre   desnasce   desmorre
                                                                           nascemorrenasce
                                                                           morrenasce
                                                                           morre
                                                                           se

A África,a miséria e a hipocrisia do Ocidente

O garoto que está estirado numa esteira,em um desses apocalípticos campos de refugiados do Sudão,há um bom tempo já quase não se move.A mãe,esquelética,apática,está deitada a seu lado,os olhos enormes e vazios,os seios murchos.Na vila-favela-acampamento,uma multidão circula.Há cabanas de pau-a-pique,choças de palha,mas a maioria se estende pelo chão mesmo,num burburinho indistinto,em meio ao calor e aos insetos.Inacreditáveis(por deixarem o conforto da "boa " Europa) profissionais dos "Médicos sem Fronteiras"circulam em meio às pessoas,olhando um e outro,fazendo o que podem em meio ao caos.È isso mesmo,a velha palavra:o horror,à la Joseph Conrad via Apocalipse now até o REAL.
De repente,um ronco de motor.Um avião da cruz vermelha sobrevoa o acampamento.O menino e a mãe viram-se na direção do ruído que deve retumbar em seus ouvidos.A enorme cruz de um vermelho berrante pintada no bojo da aeronave significa uma coisa só :possibilidade de comer,e infundir um mínimo de força em corpos exaustos,inanimados,em mentes estáticas e olhos que já viram o inimaginável.Paraquedas soltam caixas de leite em pó,biscoitos,latas de sardinha:presentinhos do ocidente apiedado e nauseado.
Na idade média,o imaginário ocidental era repleto do horror da vinda do "anticristo",para a formação do "império do mal".As constantes epidemias de peste,a fome crônica,a opressão constante e sistemática dos"poderosos",em nada diferem do que grande parte da Africa têm como cotidiano, diante do desinteresse,da apatia da Europa,que hoje,imersa na inércia do consumismo e do mercado total(que parece estar agora desmoronando),simplesmente se atem à rétorica estéril e meia dúzia de passeatas de bem intencionados.
Até o fim do século 18,a miséria e a opressão política e religiosa deram o tom na Europa.As cenas goyescas de um desses manuscritos medievais sobre a peste e a fome são assim:filmes modernos.Um parágrafo qualquer do New York Times ou do Le Monde ,documentários escandalizados de estudantes de Oxford,teses de doutoramento da Sorbonne,tours de celebridades a campos de refugiados,enquanto tiram fotos ,afagam bebês,e correm para tomar o avião de volta.Oh my God!É,o inferno pode ser mesmo aqui.Todos os dias lemos reportagens sobre a miséria da África,horrorizados assistimos ao desfilar dos quase-mortos no jornal da noite.Mas dentro de qual filme essas pessoas realmente se situam?O garoto continua deitado na esteira.E a câmera,em rápidos volteios,mostra as caixas de leite em pó,a lama desses absurdos campos.
Estamos cansados de saber de tudo isso.O ocidente precisa abandonar a retórica,a ganância obscena em que está atolado.Bondade e espiritualidade nada têm a ver com acreditar ou não em Deus.É preciso aproveitar esse momento caótico (que acho,mal começamos a viver),para mudar o rumo da nossa espécie,como seres em si,pensar em que queremos realmente nos transformar no futuro.

Amizade-(a todos os meus amigos da blogosfera)

Poema visual de Constança Lucas
Imagem daqui

Selo-"Esse Blog Mexe Com Meus sentidos"

Recebi do Valdeir do blog ponderantes ,o selo "Esse Blog Mexe Com Meus Sentidos".
Regulamento:
1)-Indicar os 10 blogs que mexem com seus sentidos;
2)-Dizer 5 coisas que mexem com seus sentidos nesse momento;
3)-Linkar quem te deu o selo e exibir no blog.
Meus indicados são:
2)-Mauri da A Katana de Bambu
3)-Marcelo do Abrazar la Vida
4)-Luciano do Gule Anda
5)-Cristiano do Braços Abertos
6)-Vanessa do Fio de Ariadne
8)-Ariane do Mariposando
9)-Paulo Veras do Paulo Veras
10)-Elaine do Professora Elaine
5 coisas que mexem com meus sentidos nesse momento:
1)-Maysa cantando
2)-O calor que faz hoje(detesto calor)
3)-A cara de felicidade da minha cachorra dormindo(estará sonhando?)
4)-?
5)-?
Agradeço ao Valdeir pela lembrança.Valeu,meu amigo!