O JARDIM DAS TULIPAS 2
Parando junto à amureta,vislumbrou os jardins lá embaixo;os vultos das roseiras,das castanheiras rente ao muro.bem devagar,passou os dedos pela superfície do muro:fria e dura.Recostou-se na parede e por alguns segundos fechou sua mente.O ar muito frio e seco batia em seu rosto e de repente o encheu de felicidade.Como as manhãs de inverno antigas,a bruma entre as árvores quando desciam para a ginástica.Todos jovens e saudáveis ,e fortes e impávidos como jovens Hermes...Mas reabriu os olhos e à sua frente estava a porta do coro da capela.Ao abrir a porta,o cheiro leve de madeira envernizada e o velhos hinários amontoados o perturbou.A luz vermelha do sacrário embaixo dava um ar fantasmagórico ao olhar.tateando na semi-escuridão sentou-se num banco.Centenas de vezes estivera ali,juntara-se ao coral nas festas;nas manhãs de verão o barulho de pássaros enchia as manhãs.Jamais pensaria em tudo que um dia realmente perdera .As querelas e brigas fúteis o afetavam como um miserável seixo no sapato.
Ajudara a varrer,a espanar,a tirar com cuidado a poeira das imagens,a polir a coroa de nossa senhora.Os dias sem fim nem começo.Não eram eles assim?E ele os vivia com um ardor de náufrago salvo,o que fora resgatado do incêndio.E naquele continuum vivia como um nunca afundar na areia movediça que tinha se tornado sua vida.A madeira dos bancos estralava e eles povoavam a nave de um silêncio inusitado na noite e para ele,no tempo.Sentiu então a costumeira seta ferir com força.Mas dessa vez com uma força diferente,uma sensação muito mais profunda do irremediável de tudo que havia se ido pelo tempo,além.Como a grama queimada do jardim,a carcaça da borboleta que pela manhã se ressecaria ao sol,os hinários mofados,o verniz manchado das cadeiras do refeitorio.Existiriam mesmo os corpos incorruptos dos santos?Catherine Labouré na Rue du Bac em Paris,Bernadette em Lourdes.Pobres coitadas,suas imagens destituidas de realidade alimentando retinas abismadas e corações incrédulos.Quanto a seu próprio corpo,lentamente se corrompia.A pele do rosto se repuchava,pendurando-se junto com as bochechas;as bolsas dos olhos ressaltavam os olhos desfocados.E as mãos ásperas,cheias das ignóbeis pintas...Era esse o corriqueiro das coisas.E ele já não percorria seu rosto no espelho com meticulosidade de maníaco como antes.que tudo se danasse!E porque não?que a morte viesse arrematar a obra.O que lhe secava os ânimo era a vida que tinha de ser vivida com todos seus rituais cuidadosamente traçados.Os bons dias mecânicos,os ai meu deus não ditos,o aperto das tenazes.Acordava por vezes sufocado,embriagado de algo que desconhecia,farto de sonhos ,que belos e fantasmagóricos em sua estranheza de lugares impossíveis,mal lhe podiam trazer qualquer lembrança palpável daqueles outros tempos que revoavam a seu redor.
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