Canção emblemática de um grande artista,durante muito tempo considerado 'meio doido','autodestrutivo'(prova quer muita gente não entendeu nada).Canção profética em sua amarga auto-ironia,sua descrição precisa da sociedade burguesa e de nosso país("eu vejo o futuro repetir o passado","eu vejo um museu de grandes novidades").Cazuza permaneceu e permanecerá como um dos gênios da nossa raça.Salve!
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Leitura Coletiva-"A Viagem do Elefante"(José Saramago)
Os romances de Saramago,muito mais que difíceis,exigem uma entrega total do leitor a seu estilo,ao seu manejo virtuoso de uma língua portuguesa raras vezes tão vibrante de vida das palavras e expressões,tão sonora,tão admiravelmente moldada.Os textos de Saramago sempre formam um bloco compacto onde a língua é a própria vida do texto.
"A Viagem do Elefante" não é diferente.Até,ao contrário,aqui,o português de Saramago nunca foi mais saboroso,a forma com que maneja suas frases é de uma impressionante lucidez,não se deixando levar pelo rastejar fácil dos vocábulos,sempre manejando seu idioma como mestre.
A viagem do elefante Salomão em 1551/52 ,de Lisboa a Viena,é contada como uma espécie de apólogo da vida humana e suas vicissitudes,seus altos e baixos,suas surpresas,boas e más,sua alegria e sua tristeza.
Presente do Rei Dom João III de Portugal ao imperador Maximiliano da Áustria,o elefante,seu tratador indiano Subrho e sua comitiva atravessam uma Europa muitíssimo diferente da que conhecemos,uma terra de sofrimento e misérias,mas também de alegria e prazer.A viagem do elefante,com seus acontecimentos tristes,reais,até atrozes,é também a viagem dos seres humanos por esse planeta,que bem ou mau,é nossa única casa.E Saramago sabe trabalhar sua narrativa com drama e humor(porque não?),dando ao texto uma densidade invejável ,profunda,com pausas que são dadas pelo próprio texto,que é lido com prazer constante,dada a maestria do escritor e seu domínio da narração e da palavra.
Fabuloso romance de um escritor que polêmicas à parte é um dos maiores do século XX,não só nas literaturas de língua portuguesa,mas também na literatura mundial.Perfeito mestre da palavra,Saramago na "Viagem do Elefante" nos lembra "(...)porque a vida ri-se das previsões e põe palavras onde imaginámos silêncio,e súbitos regressos quando pensámos que não voltaríamos a encontrar-nos.".
Um romance para ser lido com o coração aberto,saboreando uma obra prima real da nossa bela língua portuguesa.
Esse texto faz parte da Leitura Coletiva-José Saramago,em parceria com o Fio de Ariadne .
Quando penso em tudo e tudo quanto cresce
Só pode ser perfeito um rápido momento;
Que o mundo só ilusões,teatral,nos oferece,
Das quais o astral poder é secreto fomento;
Quando na evolução do homem,como da planta,
Vejo avanço e parada,a ação do mesmo ambiente:
Agora a vida exulta,agora se quebranta,
E até o maior primor termina obscuramente...
O conceito que formo,então,dessa ocorrência
Se ajusta em vós,em cuja excelsa juventude,
O Tempo destruidor se alia à Decadência,
Para quem em feia noite a vida vos transmude.
E,em guerra com o Tempo,amando-vos,decerto,
O que ele de vós tira eu novamente enxerto.
Goya(1746-1828)-El sueño de la razon produce monstros
Um dos desenhos mais célebres de todos os tempos,feito por um grande gênio da pintura,"El sueño de la Razón produce monstros" faz parte da fabulosa série "Caprichos".É a crítica do artista a uma Espanha dominada pela ignorância,pelo despotismo,pelo desrespeito à vida humana,pelo fanatismo religioso,pela miséria e pela falta de perspectivas.O título contundente do desenho diz tudo:quando a razão desaparece,tudo mais se vai com ela.Me parece que em nosso mundo,que se crê distante de tudo isso(e me pergunto porque),a razão,infelizmente começa um novo período de hibernação.Mas contra as forças da superstição,da ignorãncia e da opressão e da transformação do ser humano em mercadoria,ainda somos muitos a lutar.
Cinema-O Paciente Inglês(1996) de Anthony Minghella
Quando vi "O Paciente Inglês" pela primeira vez,me pareceu só mais um filme de amor bem realizado.Na segunda vez,que assisti com amigos e pudemos trocar impressões,tive uma epifania.
É uma obra,que sob a aparência inicial de ser mais um filme sobre as idas e vindas do amor,é uma encenação grandiosa sobre viver e perder,ganhar e perder;sobre o acaso que parece mesmo tudo reger,sobre nossa eterna insatisfação com os outros e conosco mesmos,sobre o quanto o amor e o desejo podem conter de trágico e porque não-de absoluto.
A tragédia grega,as obras primas trágicas de Shakespeare(Hamlet,Macbeth,Rei Ler,Antônio e Cleópatra,Romeu e Julieta),os clássicos da era de ouro de Hollywood(Grande Hotel,Rainha Cristina,Casablanca,E o vento levou,Nasce uma estrela,entre tantos)discutem e quase esgotam os temas do desatino do amor,da incompreensão,do sofrimento humano,da sempiterna( e não muito bem aceita e compreendida) solidão humana(quer dizer-a verdadeira solidão conosco mesmos-estar com alguém também não é garantia de nada).
"O Paciente Inglês"(que não é inglês,e sim húngaro) coloca em tintas fortes e turvas a impossibilidade da realização ideal do amor(entre aspas por ser sempre tão desejada e sempre impossível,assim então,ela nos foge).O Conde László de Almásy(Ralph Fiennes,em grande interpretação)é um arqueólogo suspeito de ser espião no Egito sob ocupação nazista na Segunda Guerra.Lá conhece Katharine Cliffton(Kristin Scott-Thomas-em mais um grande momento-linda,elegante,entre o desespero,a frivolidade e a impassível fleuma britânica)que acompanha o marido arqueólogo,Geoffrey(Colin Firth-sempre ótimo)em uma escavação no deserto..Aqui,se instala na vida colonial inglesa,sempre separada dos 'nativos',em seu orgulho colonialista de suposta civilização superior(e branca),com toda sua vida complacente de 'garden-parties'(sob 40 graus),chás das cinco,bailes e fofocas;o que quer dizer-toda uma vida em que as aparências e encenação constante são o 'modus-vivendi'.Katharine se ressente de um casamento que a seus olhos é(ou tornou-se)morno sem emoção o suficiente para que ela se interesse por Almásy.O desejo,por mais que alguns 'politicamente corretos' digam o contrário,é sempre carnal,e por ser carnal subjuga o corpo e a mente.Por mais que resistamos ou o neguemos,ele está ali,em tortura constante.Ele exige reparação física,é premente.E Katherine(uma mulher inteligente e sofisticada),começa um caso com Almásy,sabendo desde o começo,que é uma história de alguma forma
condenado ao fracasso,à não-realização.
A trama vai e vem em flashbacks.Almásy,depois de um acidente de avião que o deixa gravemente desfigurado(que vemos no final do filme),é recolhido e cuidado pela doce Hanna(a maravilhosa Juliette Binoche)em um mosteiro medieval abandonado na Toscana,Itália(uma das regiões mais belas do mundo).Hanna restaura as pinturas renascentistas de uma igreja.Essa oposição-a do Conde Almásy morrendo,abandonado e amargurado e a permanência fulgurante da arte,enfatiza esse mesmo lado amargo da vida(nunca vamos encontrar as respostas para nossas eternas perguntas metafísicas,enquanto seres humanos)-Nós passamos,nossas realizações permanecem.Nunca existirá nenhuma 'plenitude amorosa real'.
Hanna mantém um relacionamento com o indiano Kip(Naveen Andrews).É obsecada com a morte e acha que todos que se aproxima dela,de alguma maneira morrem-e como Kip é um desarmador de bombas,essa obsessão permanecerá entre os dois.
A trama avança em saltos temporais que assinalam o desenvolvimento do romance de Katharine e Almásy.Existem pontos -chaves na trama:o livro preferido do conde(História-do grego Heródoto),o deserto(de uma beleza além da imaginação) e a impressionante 'Caverna dos mergulhadores',onde acontece a consumação trágica do amor de Almásy e Katharine.Destaco a sequência final(uma das grandes cenas do cinema contemporâneo) com sua pungência e comovente beleza.
Grande direção do falecido diretor inglês Anthony Minghella,estupenda fotografia de John Seale,as icônicas interpretações de Phiennes,Scott-Thomas e Binoche (sem esquecer o grande William Dafoe,em ponta de luxo),o roteiro preciso de Minghella(baseado no romance de Michael Ondaatje),fizeram do filme o mais que merecido vencedor de 9 prêmios Oscar(incluindo melhor filme).A trilha sonora é um espetáculo à parte,dando o tom exato de desespero e ansiedade que perpassa o filme.
Uma obra para pensar,para comover(sem nenhum traço de melodrama barato);para mais uma vez,tentarmos entender como e porque somos levados pelo amor,mesmo que muitas vezes já saibamos o desfecho.Um filme para ver e rever.
Música-A-Ha Take on me-Uma saudação aos gloriosos anos 80
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